domingo, 10 de agosto de 2014

Roupa de Dormir

Ela atravessou com passo lento e tímido a sala de estar. Sentou por um instante na antiga poltrona reencapada de popeline e pôs-se a refletir, com ar de nostalgia. Momentos antes revelara a vontade de lhe beijar a boca. Sem reação continuaram em silêncio rumo ao táxi parado na esquina da noite fria. No quarto, ele lhe entregou o pijama impecavelmente dobrado, o qual ainda lavava com regularidade – feito o zelo de uma mãe para um filho que já morreu – a fim conservar o frescor e o perfume do amaciante.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Chuva

Naquele dia havia um casal sentado na beira do mar e por um instante eu suspeitei que seria a espectadora sortuda de um beijo roubado, por parte da garota. Ela inclinou-se na direção do moço, mas só para observar as nuvens. Antes tivessem se beijado, com os trovões e subitos feixes brilhantes que corriam selvagens pelos céu, e tudo teria sido muito mais dramatico - lamentei. Na noite anterior ouvi boatos de que haveria uma enxente. Tudo muito exagerado atualmente se me perguntassem, como se uma breve pancada de água pudesse encher um oceano. Eu assistia pela janela a violência na qual o barco persistia sôfrego na tentativa de quebrar a barreira invisível de ondas. E os pingos afiados multiplicavam-se como alfinetes penetrando o mar. Levantei-me e corri para fora na tentativa de avistar o casal novamente. A água cortando fria meu rosto, um quase-beijo afogado.