Queria tocar Cecília e passar com ela as horas até o sol se por. Abri a porta para os fundos e pude notar o leve reflexo de suas delicadas orelhas ao soar de meus sapatos. Me sentei próximo a ela e degustei meu gin e tonica. Suspirei. Nunca me acostumara com a vista que tinhamos de nossa casa, o cheiro fresco das montanhas a se misturar delicadamente com o salgado do mar. Um presente pra você, Cecília. Ela abriu brevemente seus olhos selvagens e tornou a mim seu pescoço, não proferiu sequer uma palavra. Fechou os olhos e posou novamente a cabeça sobre os braços, silenciosa.
Dez anos atrás me puxaria para a piscina ainda com o terno e nos amaríamos até quase morrermos afogados. Riríamos embriagados feito dois adolescentes. Era assim que Cecília fazia. Seu olhar ébrio de lascívia me devorando, sua carne macia transbordando amor. Se enrolava toda nos lençois úmidos de suor e se aconchegava em meus braços, seu rosto doce cheio de felicidade.
Agora nada mais me restava de Cecília além de sua bela imagem e seu silêncio. Os caros jantares que a levei, os bailes de luxo, as viagens que queria leva-la mas ela nunca aparecia no aeroporto ou se escondia. Criou fobia de avião me disse uma vez, alias, me deixou um bilhete. E desaparecia. Desaparecia mesmo dentro de nossa própria casa. Comprei pra ela uma casa na praia, e um carro novo, e vestidos, dezenas de vestidos que ela nunca vestia, e desaparecia com eles também.
Eu nunca pedi nada disso, lamentava. E acariciava a barriga. O corte fundo no ventre, era tudo que seus dedinhos sentiam. Seus olhos se enchendo de lágrimas. O sangue escuro escorrendo e pingando de seu joelho. As perninhas tremulas enquanto olhava para mim e perguntava porque eu tinha feito isso.
Eu queria tanto um filho - foi a ultima coisa que me disse, olhando fundo em meus olhos. Me perdoa Cecília, segurei sua mão enquanto mentia. Paguei um cirurgião para arrumar sua barriga, queria que ela ficasse bem denovo em um biquini. Acordou muda da cirurgia. Cecília calada.